A arte da harmonização de vinhos

Você sabe o real significado da expressão harmonização de vinhos? Ela diz respeito a um estado de equilíbrio que deixa a experiência de combinar um vinho com uma comida ainda mais saborosa. Ao falarmos em harmonização é preciso deixar claro que isso ocorre quando um exalta as características do outro, ou seja, o vinho não se sobrepõe ao sabor do prato nem vice-versa.

Para se conquistar esse equilíbrio entre um prato e um vinho ou espumante, existem alguns guias para se ter em mente.

Quando o prato for doce, ele aumenta a percepção de amargor, álcool e diminui a percepção de fruta e doçura do vinho. Por isso, para este tipo de receita, como regra geral é melhor escolher um vinho que possua um nível de açúcar maior do que o do prato.

Já quando o prato for salgado, este aumenta a percepção de corpo do vinho e diminui a de amargor e acidez, que se torna um elemento bom para realçar a fruta do vinho.

O sabor picante por sua vez deve ser harmonizado com vinhos que suavizam essa sensação. O exemplar deve ter altos níveis de caráter frutado e doçura, além de taninos baixos.

Ao levarmos em consideração a gordura de uma iguaria é preciso separar em duas categorias, pois existe a gordura da fritura, como por exemplo, um peixe frito e a gordura do prato em si, como uma picanha. Quando a gordura for de uma fritura, o ideal é harmonizar o cardápio com vinhos mais leves e com boa acidez para limpar o paladar. E em relação a segunda gordura, a do próprio alimento, a melhor aposta é um vinho tinto com taninos para ter estrutura e equilibrar a harmonização.

O grande segredo quando me perguntam sobre a combinação de um alimento com um vinho é entender antes de mais nada o elemento chave da receita. É importante sempre partir desse princípio, pois os ingredientes utilizados na preparação de um menu influenciam no sabor. E para saber qual o melhor vinho é necessário entender qual sabor da receita se sobressai, se é uma acidez do limão, ou o salgado de um bacalhau ou até mesmo o picante de uma páprica.

Neste contexto da arte da harmonização, vale lembrar que existem três tipos:

  • Clássica ou regional: essa basicamente já nasceu nos costumes locais, como por exemplo, Chianti e bisteca fiorentina ou, no Brasil, com Cabernet Sauvignon e churrasco.

  • Semelhança: esta é aquela harmonização que busca o equilíbrio encontrando características em comum, tanto no prato, quanto no vinho. Um prato de cogumelos, por exemplo, que traz o umami – que quer dizer saboroso em japonês e é conhecido como o quinto gosto – vai muito bem com um vinho com toques terrosos, como um Pinot Noir.

  • Contraste: neste tipo, a harmonização acontece por características opostas. Por exemplo, um gorgonzola que é um queijo salgado junto com um vinho doce, como é o caso do Colheita Tardia. Esta combinação dá muito certo, pois, aqui, realmente os opostos se atraem.

Ao meu ver, um dos pontos mais importantes é pensar em fazer harmonizações fugindo do velho padrão “vinho tinto com carne vermelha e vinho branco com peixe”, já que é sim possível harmonizar uma bela posta de salmão com um Pinot Noir do Chile ou até um Beaujolais.

Seguindo o pensamento de democratizar o vinho é interessante também aplicarmos essa regra para as harmonizações. Uma coxinha de frango fica excelente com um espumante, que terá cremosidade e acidez para limpar a gordura. Da mesma forma, porque não testar um Chablis e seu frescor com uma pipoca e um bom filme? Outra combinação que dá match é um Cabernet Sauvignon com seus taninos e acidez, com um suculento cheeseburguer.

O grande barato é inovar e testar harmonizações descomplicadas. Lembrando que este assunto não se aplica somente à vinho e comida, mas também para pessoas e momentos. Harmonizar um vinho com um belo pôr-do-sol é também uma ótima pedida.

 

* Cibele Siqueira é Sommelière da Wine.com.br, maior clube de assinatura de vinhos que tem a missão de conectar pessoas por meio da paixão pelo vinho.