Desafios Alimentares e Nutricionais em Crianças com TEA: Como Pais e Cuidadores Podem Lidar
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Uma alimentação adequada é fundamental para o bem-estar geral de qualquer pessoa. No caso de indivíduos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), essa importância é ainda maior, pois eles podem apresentar déficits nutricionais que afetam diversos aspectos do seu desenvolvimento.
Assim, para entender melhor os principais desafios enfrentados por pais, mães, responsáveis e pacientes com TEA, e quais nutrientes são especialmente importantes para lidar com a seletividade alimentar tão comum nesse transtorno, conversamos com a Coordenadora do Mestrado Profissional em Nutrição na Pós-Graduação São Camilo, Aline de Piano Ganen
1. Quais são os déficits nutricionais mais comuns em pessoas autistas, e como eles podem impactar o comportamento e o desenvolvimento?
Professora Aline De Piano – Indivíduos com TEA podem apresentar alguns déficits nutricionais associados a possíveis restrições e comportamento alimentar seletivo, tais como: cálcio, proteínas, zinco, vitamina D e B12. Nesse sentido, essa ingestão inadequada pode resultar em comprometimento do crescimento e desenvolvimento, aumento do risco de doenças crônicas não transmissíveis, como, por exemplo, a obesidade.
2 . Existem vitaminas ou minerais (como magnésio, zinco, ômega-3 ou vitamina D) que são especialmente importantes para indivíduos no espectro?
Professora Aline De Piano – Suplementos de ômega-3 e vitamina D têm sido estudados em relação ao autismo. Assim, a suplementação combinada mostrou efeitos positivos nos sintomas sociais e comportamentais de indivíduos com autismo, entretanto reforça-se a necessidade de mais estudos para que seja um consenso.
3. Por que a seletividade alimentar é tão comum no autismo, e como os pais podem introduzir novos alimentos sem causar estresse?
Professora Aline De Piano– A seletividade alimentar em crianças autistas pode estar relacionada a sensibilidades sensoriais, preferências por texturas específicas ou dificuldades com mudanças na rotina. Bem como, uma técnica eficaz é a “cadeia alimentar”, também chamada de Food Chaining, que introduz gradualmente novos alimentos semelhantes aos preferidos da criança, facilitando a aceitação.
4. Quais estratégias podem ajudar uma criança autista que só come alimentos de uma mesma cor ou textura?
Professora Aline De Piano – Além da cadeia alimentar (food chaining), é útil envolver a criança na preparação das refeições, oferecer escolhas dentro de uma variedade limitada e manter uma rotina consistente nas refeições. Assim, a paciência e a celebração de pequenos progressos são essenciais. Além disso, o acompanhamento com nutricionista especializado neste público é essencial para a adoção de estratégias efetivas.
5. Como adaptar a alimentação quando há aversões sensoriais muito fortes (ex.: recusa a alimentos pastosos ou crocantes)?
Professora Aline De Piano – Respeitar as sensibilidades sensoriais da criança é crucial. Então, ofereça alimentos com texturas aceitáveis e, gradualmente, introduza novas texturas em pequenas quantidades, sempre observando a reação da criança e evitando forçar a aceitação.
6. A dieta sem glúten e sem caseína (GFCF) realmente traz benefícios para alguns autistas, ou ainda faltam evidências científicas?
Professora Aline De Piano – As evidências sobre os benefícios da dieta GFCF são mistas. Nesse sentido, alguns estudos relatam melhorias nos sintomas do autismo, enquanto outros não encontram efeitos significativos, reforçando a necessidade de mais estudos, para que seja um consenso no TEA. Então, devemos também levar em consideração sempre a individualidade de cada paciente.
7. Em que casos uma dieta cetogênica ou low-FODMAP pode ser recomendada para autistas com problemas gastrointestinais?
Professora Aline De Piano– Dietas como a cetogênica ou low-FODMAP podem ser consideradas para indivíduos autistas com distúrbios gastrointestinais específicos, mas devem ser implementadas sob orientação e supervisão médica e de nutricionista devido à sua complexidade e possíveis efeitos colaterais.
8. Quais são os riscos de restrições alimentares muito severas sem acompanhamento profissional?
Professora Aline De Piano – Restrições alimentares sem orientação adequada podem levar a deficiências nutricionais, comprometendo o crescimento e a saúde geral., bem como piorar um quadro de seletividade alimentar. Então, é fundamental buscar orientação de profissionais qualificados na área de nutrição e TEA ao considerar mudanças significativas na dieta.
9. Qual a relação entre o eixo intestino-cérebro e o autismo? Probióticos podem ajudar?
Professora Aline De Piano – O eixo intestino-cérebro refere-se à comunicação bidirecional entre o trato gastrointestinal e o sistema nervoso central. Assim, alterações na microbiota intestinal têm sido associadas ao autismo, e estudos sugerem que probióticos podem melhorar sintomas gastrointestinais e comportamentais em alguns casos, entretanto sã necessários mais estudos para definição de quais cepas, quantidades e orientações individualizadas.
10. Alimentos inflamatórios (como ultraprocessados e açúcar) podem piorar sintomas como irritabilidade e hiperatividade?
Professora Aline De Piano – Uma meta-análise encontrou uma associação positiva entre o consumo de açúcar e bebidas açucaradas e os sintomas de TDAH em crianças, entretanto, os pesquisadores destacam a necessidade de mais estudos para confirmar essa relação. Nesse sentido, outro estudo sugere que alimentos ricos em açúcares, corantes artificiais e conservantes químicos, podem contribuir para o aumento do risco de TDAH. No que se refere ao TEA, ainda São necessários mais estudos para estabelecer essas relações. Desta forma, reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados e açúcares adicionados pode ser benéfico. Optar por uma dieta equilibrada, rica em frutas, vegetais, grãos integrais e proteínas magras, pode contribuir para a melhora do bem-estar geral e dos sintomas comportamentais. Consultar profissionais de saúde para orientações personalizadas é fundamental.
11. Quando a suplementação (como ômega-3, probióticos ou vitaminas) é realmente necessária, e como saber se está funcionando?
Professora Aline De Piano – Devemos considerar a suplementação quando há deficiências comprovadas ou necessidades específicas, sempre sob orientação profissional. Monitorar mudanças nos sintomas e realizar avaliações periódicas ajuda a determinar a eficácia da suplementação.
12. Existem suplementos que devem ser evitados em crianças autistas?
Professora Aline De Piano – Suplementos devem ser administrados com cautela. Alguns podem interagir com medicamentos ou ter efeitos adversos. Então, sempre consulte um profissional de saúde antes de iniciar qualquer suplementação.
13. Como famílias de baixa renda podem garantir uma alimentação adequada para um autista com muitas restrições?
Professora Aline De Piano – Buscar orientação de nutricionistas em serviços públicos de saúde, aproveitar programas de assistência alimentar e focar em alimentos nutritivos e acessíveis pode ajudar a garantir uma dieta balanceada dentro das limitações financeiras.
14. O que escolas e cuidadores podem fazer para ajudar crianças autistas com dificuldades alimentares?
Professora Aline De Piano – Escolas e cuidadores podem colaborar com famílias e profissionais de saúde para criar planos alimentares individualizados, oferecer ambientes de refeição tranquilos e respeitar as preferências e sensibilidades alimentares da criança.
15 . Quais são os maiores mitos sobre alimentação e autismo que precisamos desmentir?
Professora Aline De Piano – Um mito comum é que dietas específicas podem “curar” o autismo. Embora a nutrição adequada seja crucial, não há evidências de que qualquer dieta elimine os sintomas do autismo. Um planejamento e manejo individualizado, por meio de estratégias específicas para esse público são primordiais para a promoção de qualidade de vida desses pacientes e de suas famílias.

Fonte: assessoria de imprensa